Em complemento as análises físico-químicas, a ecotoxicologia se mostra como ferramenta eficiente (HAMADA, 2008). Esse ramo da ciência que trabalha em conjunto conceitos da ecologia e da toxicologia, estuda os efeitos nocivos causados por substâncias químicas a organismos vivos (ecotoxicidade), por meio de bioensaios realizados sob condições controladas em laboratório ou realizados in situ (COSTA et al., 2008).
Consistem basicamente na exposição de organismos-teste, validados como bioindicadores, a um contaminante ou uma matriz (água, solo, resíduos, efluentes, etc.), com o intuito de se simular os efeitos tóxicos causados em nível ecológico (população). Estes podem ser realizados de acordo com três classificações (Tabela 5), agudos, crônicos ou crônicos de curta duração (HAMADA, 2008).
Podem ser utilizados como organismo-teste: algas, macrófitas aquáticas, peixes, invertebrados (bentônicos ou pelágicos) e vegetais, que possibilitam avaliação ecológica, uma vez que representam diferentes níveis da cadeia trófica (DORNFELD, 2002). A escolha do organismo-teste deve levar em consideração quesitos como: a representatividade dentro do grupo ecológico em nível taxonômico ou trófico; facilidade de manuseio e cultivo em laboratório; estabilidade genética (como partenogênese, por exemplo, em Daphnia); conhecimento da biologia e sensibilidade a contaminantes (CAIRES, 2015).
Com esta ferramenta, pesquisas como a de Cauble e Wagner (2005) utilizaram larvas de Rana cascadae (espécie de rã norte americana) para exposição a diferentes concentrações do agrotóxico Roundup®, para testar os efeitos crônicos do glifosato no crescimento, desenvolvimento e metamorfose das larvas de R. cascadae. Em bioensaios preliminares de ecotoxicidade aguda, determinaram uma Concentração Letal a 50% da população exposta, CL50, 3,2 mg L-1.
Corbi, Gorni e Correa (2015) realizaram estudos de sensibilidade com o organismo Allonais inaequalis (Oligochaeta: Naididae), expostos em ensaios estáticos, durante 96 horas e foram encontrados resultados de CL50 com cloreto de potássio e cloreto de zinco, de 3,55 a 5,36 g L-1 e 0,09 a 0,510 mg L-1, respectivamente, propondo assim este organismo em protocolos de ecotoxicologia para amostras de água e sedimento de regiões tropicais, como o Brasil.
Porém, ao se interpretar os dados ecotoxicológicos, avaliando os efeitos dos contaminantes em escalas ecológicas de comunidades, são necessárias ferramentas estáticas e análises de modelos, como por exemplo, o modelo de análise de risco ambiental (COSTA et al., 2008).
Em laboratório os ensaios de ecotoxicidade, são realizados sobre condições específicas e com endpoints de interesse, como tóxico e não tóxico (ecotoxicidade aguda), e outros como taxa de reprodução (ecotoxicidade crônica) e, proporcionam dados em nível de população, para uma espécie a uma substância. Em ambientes naturais diversas espécies coabitam os ecossistemas, interagindo e respondendo de formas particulares a contaminação presente no ambiente (SANTOS et al., 2015).
Por isso, extrapolar os dados obtidos de indivíduos para comunidades e correlacionar com índices ecológicos, tem se mostrado um desafio para as pesquisas ambientais. Para isso, são necessários cálculos que combinem os resultados ecotoxicológicos com modelos matemáticos baseados nas propriedades conhecidas dos contaminantes estudados (DOU et al., 2014).
Assim, ao se determinar o risco ambiental de um contaminante é necessário determinar a ecotoxicidade aguda e/ou crônica e avaliar um ou mais endpoints em conjunto com a avaliação da dose-resposta. A dose resposta pode ser mensurada em dois tipos, Concentração Letal a 50% da população (CL50) e Concentração Efetiva a 50% da população (CE50), sendo a CL utilizada para organismos vertebrados e invertebrados e a CE utilizada para vegetais e algas.
Utilizando estes dados, pode-se calcular o risco ambiental baseado na ecotoxicidade, como por exemplo, por meio do método da análise de Q (Tabela 6) (SOUZA, 2008).
Onde: Q = CAE / CE50 ou CL50
CAE = Concentração ambiental estimada é o valor de um contaminante que chega efetivamente ao ambiente; este valor pode ser utilizado de acordo com dados da literatura, ou em alguns casos, como em ecossistemas aquáticos, é considerado como 100% da maior dose normalmente utilizada (GOKTEPE, PORTIER, AHMEDNA, 2004; MEDEIROS, 2008; SOUZA, 2008; ABE, 2012).
Baseado nestas metodologias, Solomon et al. (1996) testaram o agrotóxico Atrazina, um dos mais usados na América do Norte na época nas plantações de milho, no controle de plantas gramíneas invasoras. Foi determinada a presença do agrotóxico em 76 reservatórios em 11 estados norte-americanos obtendo uma porcentagem de 92% de ocorrência do contaminante; além disso, foi determinado o risco ambiental (Q) com base nos ensaios de ecotoxicidade com os organismos de grupos de fitoplâncton, zooplâncton, macrófitas aquáticas, macroinvertebrados bentônicos e peixes; concluíram que a Atrazina não possui risco ambiental significativo, pois apresentou toxicidade com valores acima de 20 μg L-1, sendo o encontrado nas determinações de Atrazina valores menores ou iguais a 5 μg L-1.
Goktepe, Portier e Ahmedna (2004), avaliaram o risco ambiental do composto Azadiractina em duas bases de óleo de neem, em 6 espécies de animais aquáticos, Promcambarus clarkii, Penaeus setiferus, Palaemonetes pugio, Callinectes sapidus, Daphinia pulex e Culex quinquefasciatus e o risco foi calculado pelo valor de Q. Os autores concluíram que as formulações Bioneem™ e Neemix™, não apresentam Risco Ambiental significativo, pois os resultados não foram superiores a Q = 0,5.
Pusceddu et al. (2017) realizaram estudos de risco ambiental em sedimentos contaminados com triclosan, testando os organismos Chironomus xanthus para toxicidade aguda e Ceriodaphnia dubia para toxicidade crônica; determinaram a CL50 de 45,26 μg L-1 para C. xanthus e para ecotoxicidade crônica a LOEC (Menor Concentração de Efeito Observado) de 6,94 μg L-1 para C. dubia no sedimento, sendo estes resultados equivalentes aos valores de CL50 e LOEC encontrados nos bioensaios de ecotoxicidade com o contaminante que são respectivamente de 47,28 μg L-1 e 7,24 μg L-1. Concluíram que os sedimentos contaminados com triclosan representam um alto risco para os organismos aquáticos.
Diante do exposto, a avaliação de risco ambiental é um conceito importante e deve ser aplicado para as avaliações de liberação de agrotóxicos perante os órgãos reguladores e fiscalizadores em conjunto aos ensaios de ecotoxicidade. É pela aplicação metodologias como essas, que os estudos ecológicos criam subsídios para a elaboração de políticas públicas voltadas a conservação do meio ambiente.
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Este texto acima, foi tirado da minha Dissertação de Mestrado e qualquer dúvida sobre as referencias ou se quiserem ler o texto na integra, favor entrar em contato via e-mail eduardocaires.ec@gmail.com
MSc. Eduardo Caires
Sou Biólogo, Mestre em Desenvolvimento Territorial e Meio Ambiente, especialista em recursos hídricos e avaliação de risco ambiental. Atuo com Consultoria Ambiental e Perito Judicial no Tribunal de Justiça de São Paulo.
No setor de Meio Ambiente me consolidei nos seguintes tópicos: análises ambientais; avaliação da qualidade de cursos d'água, água para consumo humano; tratamento de efluentes (esgoto sanitário e industrial); gestão de resíduos sólidos; gerenciamento de áreas contaminadas; recuperação de áreas degradadas; valoração de dano ambiental; ecologia aplicada; mitigação de impactos ambientais e licenciamento ambiental.
Sou Biólogo, Mestre em Desenvolvimento Territorial e Meio Ambiente, especialista em recursos hídricos e avaliação de risco ambiental. Atuo com Consultoria Ambiental e Perito Judicial no Tribunal de Justiça de São Paulo.
No setor de Meio Ambiente me consolidei nos seguintes tópicos: análises ambientais; avaliação da qualidade de cursos d'água, água para consumo humano; tratamento de efluentes (esgoto sanitário e industrial); gestão de resíduos sólidos; gerenciamento de áreas contaminadas; recuperação de áreas degradadas; valoração de dano ambiental; ecologia aplicada; mitigação de impactos ambientais e licenciamento ambiental.
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